Uma mulher em uma manifestação para exigir a liberdade dos adolescentes detidos pela crise pós-eleitoral na Venezuela, no dia 26 de setembro, em Caracas
“Não somos terroristas”: Thiany Urbina lê uma carta manuscrita assinada por seu filho, um estudante de 16 anos detido após as eleições presidenciais na Venezuela, e de outros sete adolescentes acusados de terrorismo, incitação ao ódio e furto.
Mais de 2.400 pessoas foram detidas durante os protestos após a questionada reeleição do presidente Nicolás Maduro, em meio a denúncias de fraude por parte da oposição. Deste número, 100 eram menores de idade.
Um grupo de 86 jovens foi libertado, mas estima-se que cerca de 30 ainda estejam detidos. Miguel, filho de Urbina, junto com Yenderson, Daiber, Héctor, Bleider, Ángel, Diomer e Alexander, que também assinaram a carta, permanecem em uma delegacia em Caracas à espera de sua libertação.
“Algum dia sairei deste lugar feio, deste inferno ao qual ninguém pertence”, diz o texto lido em voz alta por Urbina, enquanto ao fundo pode-se ouvir o protesto pela liberdade de seu filho nesta quinta-feira (26), em frente ao Ministério Público de Caracas.
“Isso não é vida, como é possível estar pagando por algo que nem meus companheiros, nem eu fizemos?”, indaga no documento.
Os protestos realizados entre os dias 29 e 30 de julho deixaram 27 mortos, incluindo dois militares, e cerca de 200 feridos. Os detidos foram classificados como “terroristas” por Maduro.
Miguel Urbina foi preso no dia 2 de agosto quando comia um doce na entrada de sua casa. “Dois funcionários chegaram e o levaram”, conta sua mãe, uma manicure de 32 anos que afirma que ele não teve envolvimento nas manifestações.
Ela garante que o filho está isolado junto aos demais adolescentes em um espaço onde não têm contato com presos comuns. “Ele me disse que estava com medo. Meu filho não é um criminoso, não é um terrorista”, insiste.
Nesta quinta-feira, eles entregaram um documento ao Ministério Público solicitando sua liberação.
“Estamos privados de liberdade, presos como se fôssemos criminosos ou um perigo para a sociedade, somos inocentes de todas as acusações das quais estão nos culpando”, diz a carta.
Familiares contam que, antes de serem levados à unidade policial, alguns dos adolescentes foram submetidos a choques elétricos e colocaram um saco em suas cabeças, ameaçando enchê-los com gás lacrimogêneo.
– “Ajude-nos a sair daqui” –
Também com 16 anos, Ángel Moisés Ramírez, filho de Nérida Ruiz, de 39, está detido há quase 60 dias. Ela abraça uma foto de seu filho mais velho vestido com um uniforme escolar.
Ele foi levado de sua casa enquanto cuidava de seu irmão de um ano e meio. Foi acusado de “furto qualificado, incitação ao ódio, terrorismo e resistência à autoridade” depois que uma das motos roubadas em um armazém foi colocada na estrada que leva à sua residência.
“Ele começa na semana que vem” o último ano do ensino médio, disse Ruiz à AFP. “E essa é a maior preocupação dele, o início das aulas e como vai fazer isso”, destaca a mãe, que trabalha como caixa em uma loja de móveis.
Devido às dificuldades financeiras da família, Miguel não estava estudando, segundo Nérida, que conta que todos em sua casa trabalham, incluindo seu marido e seu filho, aprendendo carpintaria.
“Ele não estava estudando, mas ia começar a estudar para retomar o terceiro ano” do ensino médio, completa a mãe, que pede a libertação de todos os menores detidos.
Ela se agarra ao papel onde está registrado o pedido de liberdade de Miguel, o mais velho de seus quatro filhos.
“A única coisa que pedimos é justiça. Por favor, ajude-nos a sair deste lugar feio, não aguentamos nem mais um dia neste lugar, somos apenas jovens, não temos nada a ver com o que está acontecendo neste país, não somos terroristas”, completa a carta.
Fonte: Istoé