O escritor e sociólogo Émile Durkheim (1858-1917) desenvolveu a ideia do “espírito de coletividade” como uma forma de compreender a coesão social. Segundo ele, a solidariedade e a interdependência entre os indivíduos eram fundamentais para a manutenção de uma sociedade saudável.
No entanto, nos dias turbulentos em que vivemos, parece que falar de valores comunitários se tornou uma mera utopia, uma vez que o ambiente atual é cada vez mais favorável à desunião e à individualidade.
Um dos exemplos mais evidentes dessa falta de coesão social está na religião, que deveria ser um elemento capaz de religar o homem ao seu Criador e promover a união entre as pessoas. Infelizmente, muitas vezes a religião se politiza e toma partido em questões sociais e políticas, contribuindo para a desagregação da sociedade ao invés de promover a sua união.
A politização das igrejas acaba gerando conflitos e divisões, em vez de fortalecer os laços entre as pessoas.
Outro campo no qual a desunião se manifesta é a política.
Em teoria, a política deveria ser o meio pelo qual a sociedade busca o bem comum e se une em torno de projetos e ideais.
No entanto, observamos que a política muitas vezes se torna um instrumento de desunião, com partidos e líderes polarizando a sociedade e promovendo o confronto entre diferentes grupos.
A falta de diálogo construtivo e o excesso de confronto ideológico têm minado a capacidade de unir esforços em prol do bem-estar coletivo.
Até mesmo o esporte, que historicamente teve o poder de unir pessoas de diferentes origens e culturas, tem perdido o seu espírito esportivo.
O comportamento agressivo de torcedores, a rivalidade exacerbada entre times e as inúmeras polêmicas envolvendo corrupção têm contribuído para a desunião dos fãs. Em vez de ser um elemento de integração social, o esporte muitas vezes acaba gerando conflitos e divisões, alimentando rivalidades que vão além das quatro linhas.
Além disso, as redes sociais, que surgiram como uma ferramenta de conexão e comunicação, têm se consolidado como espaços de desunião e promoção de conflitos. A facilidade de disseminar informações e opiniões tem levado a uma polarização cada vez maior, com pessoas se agrupando em bolhas ideológicas e atacando aqueles que pensam diferente. A cultura do cancelamento e a propagação de ódio virtual têm gerado uma sociedade cada vez mais fragmentada e intolerante.
Nesse contexto, é evidente que perdemos a capacidade de elogiar, reconhecer e valorizar o próximo e suas realizações.
A crítica mordaz e o julgamento tornaram-se o foco principal, enquanto a empatia e a compreensão se tornaram escassas.
A sociedade contemporânea se define cada vez mais como uma sociedade de indivíduos egocêntricos, em que cada um defende seus próprios interesses sem se preocupar com a vida do próximo, do vizinho, do parente ou do amigo.
A lição de Durkheim sobre o espírito de coesão social parece ter perdido sentido em um mundo cada vez mais fragmentado.
No entanto, é importante resgatar esses valores comunitários e trabalhar pela reconstrução de uma sociedade mais unida.
É fundamental promover o diálogo, a tolerância e o respeito pelas diferenças, buscando pontos de convergência e construindo projetos coletivos que beneficiem a todos.
A transformação desse cenário requer esforços conjuntos, tanto por parte das instituições e líderes políticos e religiosos, quanto por parte de cada indivíduo. A educação desempenha um papel fundamental nesse processo, pois é por meio dela que se pode cultivar os valores de coletividade, empatia e solidariedade desde cedo.
O estímulo ao pensamento crítico, à compreensão das diferenças e ao respeito mútuo são elementos essenciais para a formação de uma sociedade mais coesa.
Em suma, o espírito de coesão social, conceituado por Émile Durkheim, parece estar ausente nos dias turbulentos que vivemos.
A desunião e a individualidade têm prevalecido em detrimento da solidariedade e da interdependência entre os indivíduos.
No entanto, é necessário refletir sobre esse panorama e buscar meios de resgatar os valores comunitários, promovendo a união em vez da desagregação. Somente assim poderemos construir uma sociedade mais justa, igualitária e harmoniosa para as futuras gerações.
Roberto Dantas é acadêmico do curso de direito