Thomas Bauer/Instituto Sociedade População e Natur
O cerrado perdeu volume de água equivalente a 30 piscinas olímpicas por minuto em 18 anos.
A informação é de análise de dados inédita divulgada nesta segunda-feira (23) pela Ambiental Media. Segundo os dados analisados, as seis grandes bacias hidrográficas do cerrado perderam 27% da vazão entre as décadas de 1970 (1970–1979) e 2010 (2012–2021).
O percentual equivale a 30 piscinas olímpicas por minuto: em 24 horas, o volume seria suficiente para abastecer o Brasil por três dias e meio.
Os dados mostram, por exemplo, que entre 1970 e 2010, além da queda de vazão de água, o número de chuvas recuou 21%. Em contrapartida, a perda de água das plantas pelo aquecimento das temperaturas aumentou 8%. Ou seja, o bioma está perdendo mais água para a atmosfera e sofrendo com menos chuvas.
Chamada de projeto Cerrado – o Elo Sagrado das Águas do Brasil, a análise avaliou as vazões de importantes bacias hidrográficas do bioma desde a década de 70, com base em dados fornecidos pela ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico). São elas: Araguaia, Paraná, Parnaíba, São Francisco, Taquari e Tocantins.
Além da diminuição das chuvas, a demanda por água aumento no bioma com a abertura de novas áreas irrigadas para o plantio de soja, entre outras commodities agrícolas. Na bacia do São Francisco, por exemplo, a análise revelou um aumento da plantação de soja em 70 vezes.
Para levantar os dados, a Ambiental Media levou em conta as diferentes formas de uso e ocupação do solo ao longo de 37 anos, com base nas informações do MapBiomas – rede colaborativa de co-criadores formada por ONGs, universidades e empresas de tecnologia, que mapeia a cobertura e uso da terra no Brasil.
Nesse período, a vegetação nativa encolheu 22% nas seis bacias, enquanto a área destinada para a soja cresceu quase 20 vezes: de 620,7 mil em 1985 para 12 milhões de hectares em 2022.
Para o geógrafo e coordenador científico do projeto, Yuri Salmona, “o desmatamento é o grande fator que interfere na segurança hídrica nas últimas décadas”.
Se soma ao cenário ainda o impacto das mudanças climáticas, sentido em todo o cerrado pelo aumento generalizado da evapotranspiração potencial (ETp): a quantidade total de umidade que sobe do solo e da vegetação para a atmosfera.
Ou seja, mais radiação solar está incidindo sobre o bioma e há uma aceleração da perda de água, dificultando a sobrevivência das plantas durante a estação seca.
“O período chuvoso tem sido reduzido em praticamente dois meses”, diz Salmona. Ou seja, houve uma diminuição no volume de água que deveria seguir ao subsolo, alimentar aquíferos e lençóis freáticos e garantir ao cerrado o papel de regulador hídrico.
Com muita chuva concentrada num período pequeno, a água não tem tempo de infiltrar. O solo fica saturado e a chuva escorre superficialmente e com força, gerando enchentes e erosão. “Não precisa faltar chuva para haver um cenário de seca. Basta que a água venha na hora errada”, alerta Salmona.
Cerrado e amazônia
Para Salmona, a “proteção da amazônia depende intrinsecamente da proteção do cerrado”. “A amazônia não é uma ilha, ela não está isolada do resto do país, e a maior fronteira dela é com o bioma cerrado”, explicou.
Ele acrescenta que a COP30, que será realizada em novembro em Belém (PA), é uma oportunidade para alavancar a importância do bioma. “Podemos ser uma COP que não esqueceu do cerrado, que não deixou o cerrado ser apagado”, defendeu.
Fonte: R7