O advogado Rodolfo Borges, de 46 anos, já participou de algumas audiências ao longo de seus 20 anos de carreira nas áreas trabalhista e empresarial.
Eu queria conciliar, eu queria resolver, ajudar todo mundo. E [com esse acordo] ia ficar bom para todo mundo
Nenhuma, no entanto, terminou como a do dia 30 de outubro de 2020, quando ele entrou em uma videoconferência para negociar a favor de seu cliente em uma ação trabalhista.
Se o dito popular afirma que tudo acaba em pizza, aqui vale outra máxima: pode acabar em cachorro-quente. E com todos os envolvidos satisfeitos com o resultado.
“Eu queria conciliar, eu queria resolver, ajudar todo mundo. E [com esse acordo] ia ficar bom para todo mundo”, explicou o advogado que sugeriu a negociação, em entrevista ao UOL.
O que aconteceu
O caso em questão falava sobre uma demissão ocorrida sem justa causa durante a pandemia. O cliente de Rodolfo trabalhava em uma famosa hamburgueria de Cuiabá desde julho de 2019, e foi dispensado em março de 2020 sem maiores explicações.
Ele pedia, no processo, o pagamento de férias vencidas e horas extras – o que lhe foi concedido. E acabou também com a posse de uma moto comprada em nome do dono do comércio e que tinha as parcelas pagas pelo trabalhador.
No final da mediação, a juíza bateu o martelo: a empresa teria que pagar a ele um total de R$ 21 mil em dinheiro e um acréscimo inusitado.
Do montante, R$ 20 mil eram do cliente. O R$ 1 mil restante se referia ao honorário do advogado, que também pediu 20 cachorros-quentes da lanchonete “Zé Dog”.
“A reclamada pagará ao reclamante a importância líquida e total de R$ 21 mil, sendo R$ 20 mil a título de crédito do reclamante e R$ 1 mil referente aos honorário advocatícios sucumbenciais, além de 20 cachorros-quentes a serem consumidos no local, de forma gradual, ao patrono do autor”, escreveu a juíza Paula Cabral Freitas.
O próprio Rodolfo explica como isso aconteceu.”Chegou na audiência, a gente foi negociar e ele queria bater num valor menor que a minha pretensão. Eu falei: ‘olha, vamos fazer o seguinte, para fechar no jeito que você quer, eu fecho neste valor. Mas eu quero mais 20 cachorros-quentes'”, contou.
O dono do Zé Dog ainda tentou argumentar e oferecer apenas 10 lanches. Rodolfo rebateu. “Não, [quero] 20”, disse. E assim foi decidido.
Por um aplicativo de delivery, os lanches são vendidos a partir de R$ 10. Eles são compostos por pão de cachorro-quente, queijo mussarela, molho, vinagrete, batata palha e até três salsichas O estabelecimento fica na região central da capital de Mato Grosso.
“É uma delícia”
Ele mesmo pontuou os motivos que o levaram a fazer a proposta: o cachorro-quente envolvido é famoso na cidade, ele conhecia o proprietário e a questão trabalhista não tinha a ver com o dono – mas com um genro dele, responsável por gerir um outro ponto do negócio.
“Esse cachorro-quente é muito gostoso. O pão é de primeira, a salsicha é de primeira, ele faz um vinagretezinho. É uma delícia”, pontua o advogado. Não à toa, os 20 cachorros-quentes que fizeram parte do pagamento já foram consumidos.
“Peguei uma turma de amigos, fomos para lá e detonamos”, riu. Rodolfo continua frequentando o estabelecimento, como qualquer outro cliente, dois anos depois do episódio.
O advogado explicou que esse tipo de acordo não é comum, e depende da postura do profissional que está conduzindo a discussão na audiência.
“É a vontade de resolver e a flexibilidade. Os dois lados têm como propósito conciliar. A Justiça, representada em partes pelo advogado, tem que negociar. Então, ele tem que fazer a parte dele”, finalizou.
Por CAMILA CORSINI